Badius da Guiné, Guiné-Bissau, 2008

Os primatas sapiens sapiens da Guiné

No índice de desenvolvimento humano da ONU a Guiné-Bissau encontra-se junto ao fim do bloco dos países classificados como tendo baixo índice de desenvolvimento. Com 188 países reportados em 2015, a Guiné-Bissau estava colocada no lugar 178. Por comparação, Portugal estava no lugar 43 junto ao fim do bloco com índice de desenvolvimento muito elevado. A esperança média de vida à nascença é de apenas 55 anos enquanto que em Portugal é de 81. Ou seja, em média, se uma pessoa da Guiné-Bissau vivesse os mesmos anos que um português, em vez de morrer por volta dos 55 teria ainda mais  de metade dos anos da sua vida já vivida para continuar a viver. Dito assim impressiona, não? De 2009 a 2014, baixou infelizmente 4 lugares no índice e Portugal não subiu sequer uma única posição.

Refiro estes números por comparação com Portugal apesar de, como se vê, Portugal não ser dos melhores exemplos para servir de comparação, apenas porque é a realidade perceptível para quem aí habita. Não traduzem em absolutamente nada as especificidades enquanto seres humanos de cada uma das populações dos diferentes países do mundo e infelizmente é difícil traduzir estes números para o que de facto é relevante na realidade do dia-a-dia de cada uma das populações. Apesar de toda a matemática e estatística, estes números não traduzem e não caracterizam o que há de mais genuinamente humano entre as pessoas. Por exemplo, não traduz a solidariedade entre pessoas e povoações ou a solidariedade com o viajante que fura o pneu e para o qual, apesar de desconhecido e usualmente com mais posses, não se limitam ajudas.

O número conseguido pela Guiné-Bissau nesta tabela traduzem-se grosseiramente por um país onde não há distribuição centralizada de electricidade, não há acesso a água potável através de uma rede de águas e de saneamento básico, não há  transportes colectivos que permitam deslocações no país,… percebe-se assim a dureza das condições de vida e a razão da esperança média de vida à nascença ser tão baixa. Havendo falta de quase tudo o que define um estado moderno e que este deveria providenciar, torna provavelmente ainda mais relevante e profundo os laços entre pessoas numa estreita solidariedade que de certa forma já escapa aos países industrialmente desenvolvidos, nomeadamente nas suas grandes metrópoles. Num país onde quase tudo falta, a entre-ajuda é essencial para se conseguir ultrapassar os infindáveis problemas da vida…

Visitar pela primeira vez a Guiné-Bissau é uma experiência única, diferente e ainda por cima e por definição, irrepetível. Por mais que nos ponham de sobre-aviso acerca da severidade destas duras condições de vida, nunca se fica realmente preparado para o tsunami da realidade. A percepção intelectual dos problemas fica sempre aquém de vivê-los. Uma coisa é perceber o problema da pessoa que é explorada pelo chefe, pelo patrão. Outra completamente diferente é de facto ter de lidar com o problema e as suas consequências. Dito de uma forma positiva, consegue-se verdadeiramente explicar o que é o amor, sem ter vivido um?

E, resumidamente, foi por isto e outras razões menos importantes que na primeira e única visita não consegui tirar fotos em Bissau.

Os primatas badius da Guiné

A fotografia de vida selvagem, nomeadamente de macacos, coloca vários problemas. Primeiro porque os macacos são pequenos e não param quietos. Depois porque se encontram longe, no topo junto à copa das árvores e isto coloca contrastes de luz muito grandes entre o sol tropical de fundo e a sombra das folhas por onde eles se deslocam. Por fim porque os animais não são parvos e sabem que estão a ser observados. Isto tudo considerado implica que é necessário uma lente com uma distância focal elevada e que para evitar tremeliques é preciso utilizar velocidades de obturação elevadas para fotografias sob copas de árvores muitas vezes bastante sombrias. Há ainda problemas com a focagem pois muitas vezes há ramos a atrapalhar e os animais estão quase sempre em movimento.

Assim, a foto necessitou de uns ajustes tradicionalmente designados em inglês por dodging & burning (herança dos tempos do analógico) de modo a atenuar os grandes contrastes de luminosidade. Isto é, baixar a luminosidade em zonas que recebem directamente luz do sol e aumentá-la no que interessa, ou seja, os fatangos (designação crioula dada aos Procolobus badius temminckii).

A foto foi tirada na Província de Tombali, no Parque Nacional de Cantanhez e badius não corresponde a nenhuma pronúncia nortenha de vadios, significando muito simplesmente castanho avermelhado.

 

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